De novo a falar de cinema, o filme que me traz hoje ao blog é um dos mais arrepiantes dos últimos tempos… Falo-vos de “The Conjuring – A Evocação”. Antes de existir Amityville, existia Harrisville… Baseado em factos reais, o filme apresenta-nos a história que ficou conhecida, para muitos, como “Harrisville Haunting” ou “Perron Haunting Family”, onde o casal de demonólogos Ed e Lorraine Warren, que trabalharam também no conhecido caso Amityville, ajudam o casal Perron, com as suas cinco filhas, a lidarem com assombrações que surgem na sua nova casa. Mas antes, um outro caso é-nos apresentado, o da boneca Annabelle. E este também é um caso real. Aliás, “The Conjuring – A Evocação” tem começo logo com uma das partes mais assustadoras, ao vermos o par a conjurar algo verdadeiramente maléfico - a boneca possuída pelo mal, Annabelle. Serve-nos de mote para todo o suspense e medo que iremos sentir ao longo de todo o filme… A família Perron tinha acabado de se mudar para uma casa de campo isolada, desconhecendo o seu passado macabro, oriundo de uma bruxa praticante do satanismo que lá morara no século XIX. Ao chegarem, a cadela Sadie sente logo as manifestações sobrenaturais e, por isso, nem sequer chega a entrar na casa… As acções que vão depois ocorrendo assombram até os mais cépticos, como o ranger e bater violento de portas, objectos que se deslocam sozinhos, crianças sensíveis a manifestações paranormais, além de termos sempre presente a “hora do terror”, às 3h07 da manhã… O filme é exímio na forma crescente da construção do suspense, ao expor gradualmente a atmosfera de pavor, não só das personagens, como também quem acompanha a história. E este é o grande trunfo do realizador James Wan, que faz do espaço interno da casa mais do que um mero cenário de acção, transformando-a também numa personagem, que parece estar todo o momento a observar e a interagir. Nos primeiros momentos, ficamos com uma completa noção do espaço, mas à medida que vamos conhecendo os limites da casa, os seus espaços ocultos – paredes falsas e cantos escuros, é que vão surgindo as primeiras tensões… Mas encontramos também aqui, no coração da história, um grande amor. Um amor maternal, incondicional. Lorraine e Ed Warren são-nos apresentadas como pessoas normais, discretamente religiosas, que percebem do além. Não só o além, mas todas as forças malignas que querem comunicar e prejudicar quem está vivo. Numa palestra, eles mesmos brincam, ao dizerem que são chamados de “caçadores de fantasmas” ou até de “loucos”, por trabalharem um tema que, por mais que assuste muita gente, ainda é considerado por muitos como farsa… A construção das personagens pelos experientes Patrick Wilson e Vera Farmiga dá credibilidade às respectivas habilidades. Lorraine é vidente, enquanto Ed é demonólogo. A forma com que os actores projectam os seus conhecimentos e não escondem as suas vulnerabilidades, torna a história mais palpável. Isto porque, enquanto investigam as actividades paranormais na casa dos Perron, eles também sofrem dramaticamente. Não são invencíveis, nem mesmo sabem tudo, apenas vão encontrando alternativas para resolver os problemas que vão surgindo… Fazem também parte do elenco principal Ron Livingston e a excelente Lili Taylor, como os patriarcas da família Perron.
Stephen King, o aclamado autor americano de livros de terror, em tempos escreveu que existem três níveis dentro do género, em qualquer manifestação artística. O primeiro é o do “nojo”, o mais básico e o mais fácil de ser conseguido – basta apresentar uma cena com sangue e vísceras, que afecta logo o leitor ou o espectador. O segundo nível é o do horror, quando ocorre a revelação do monstro causador do medo, algo também destinado a chocar. Já o terceiro, o mais apurado e sofisticado, e também o mais difícil, aquele que muitas obras não conseguem alcançar, é o do terror propriamente dito, sustentado quando a história exercita sobretudo a imaginação do público, fazendo-o imaginar o causador do mal… E como se sabe, a imaginação é bem mais poderosa do que qualquer efeito visual ou maquilhagem concebidos por qualquer cineasta. Tudo isto para vos dizer que “The Conjuring – A Evocação”, na maior parte da sua narrativa, situa-se neste terceiro nível. Além disso, o filme vem ainda com aquele “selo” destinado a aumentar o factor medo no espectador, o sempre questionável mas eficaz “Baseado em fatos reais…”. Por exemplo, há um momento no qual uma das filhas dos Perron aponta para um canto escuro do seu quarto, dizendo, entre lágrimas e soluços, que está la alguém. Não há nada lá que vejamos, mas a câmera de James Wan detém-se nessa situação o tempo suficiente para nós observarmos o lugar e começar a imaginar a presença ali. E nesse momento, todos os espectadores ocupam o lugar daquela menina, e começam a imaginar coisas… É por funcionar tão bem neste nível que “The Conjuring – A Evocação” se torna num raro filme de terror cuja maior qualidade é apelar à imaginação, aos nossos medos sempre vivos – do escuro, do desconhecido, do bicho-papão em baixo da cama. Está ao nível mais alto mencionado por King. E não é à toa que Bruce Diones, da "New Yorker", escreveu que "Wan transforma os muitos solavancos durante a noite numa pequena sinfonia hitchcockiana de terror, por meio de longas e estranhas cenas, silêncios dramáticos e sustos repentinos que são assustadoramente envolventes". “The Conjuring – A Evocação” estreou nos cinemas americanos em meados de Julho, arrecadando $41,9 milhões. Um resultado de bilheteira que coloca o filme entre os mais bem sucedidos de terror dos últimos tempos. Além da bilheteira, foi também muito bem recebido pela crítica e pelo público, sendo um dos filmes de terror dos últimos 10 anos a ganhar nota máxima do público. Nenhum filme do género fora melhor avaliado até ao momento. Por isso, aconselho! É um dos melhores filmes do género que vi. Que põe constantemente os nossos nervos à flor da pele. E digo-vos: nunca o jogo da cabra-cega foi tão aterrador…

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