Quem diria que esta doce menina, que a muitos encantou, já tem 50 anos... Tudo começou em 1954, quando o ilustrador belga Marcel Marlier foi convidado pela editora Castman para criar uma menina que pudesse ser figura de proa de uma coleção de livros infantis. Ao aceitar tal desafio, Marcel estava longe de imaginar que a sua nova personagem se iria tornar a estrela das infâncias de milhares de crianças em todo o mundo, nem que a iria desenhar ao longo de 56 anos e 60 livros...

Em Portugal, a personagem só veio a surgir 12 anos depois, já em 1966, pela editora Verbo. A tal menina chamava-se Anita (e não Martine, como no original). Também por cá, rapidamente se tornou um clássico entre a criançada, especialmente as raparigas. “Anita, dona de casa” foi o primeiro livro da coleção publicado no nosso país.

As aguarelas realistas de Marlier, conjugadas com a vida quotidiana de Anita, imaginada e descrita por Gilbert Delahaye, tornavam cada acontecimento mais banal — como ir às compras, à praia, fazer ballet, andar de comboio ou passear no campo — numa improvável e deliciosa aventura. Esta dupla foi responsável por criar todo um imaginário que fazia cada criança sonhar que os seus dias também poderiam tornar-se maravilhosos e aventureiros como os da personagem. Sobretudo nos anos 70 e 80, os livros da Anita eram um presente obrigatório nas festas de aniversário ou no Natal. De facto, eram muito completos e serviam para tudo: para treinar a leitura dos mais pequenos, para os novos artistas copiarem os desenhos, para mostrar regras de boa educação, etc. Liam-se e reliam-se sem parar, sempre como o mesmo prazer.

Ao longo do tempo, as ilustrações foram-se alterando, nomeadamente o rosto de Anita, e a temática das histórias procurou adaptar-se aos novos tempos. A “heroína” que, nos anos 60, ia às compras ou cuidava do irmão, passou a ser ecologista, a fazer cursos de culinária e a usar calças. Contudo, as suas aventuras terminaram em 2010, já com um “cheirinho” a contos de fadas com "Anita/Martine e o Príncipe Misterioso" (último livro). Marlier veio a morrer nesse mesmo ano, quase tão famoso quanto a personagem que fez nascer.

No ano passado, os direitos portugueses da coleção foram adquiridos pela editora “Zero a Oito”. Uma nova tradução foi feita e, tal como os Estrumpfes passaram a ser Smurfs, a Anita passou a chamar-se Martine, como na edição original belga. Esta mudança destinada às crianças do futuro não deixa de ser uma desilusão para todos os que cresceram com a Anita. Na verdade, esta troca não é mais do que um regresso à origem, uma vez que a “nossa” Anita foi sempre Martine no seu país de origem, a Bélgica. Foi aqui que o primeiro livro da sua coleção foi publicado, em 1954, com o título original “Martine à la Ferme” (em Portugal veio a ser “Anita na Quinta”). Cerca de 12 anos depois, há precisamente meio século, Martine chegou a Portugal, e ganhou um novo nome: Anita.

Contudo, esta mudança foi feita também na crença de que a Martine irá conquistar as famílias portuguesas. Atualmente, as crianças falam uma linguagem universal e a maioria delas não sabe quem é a Anita. Por isso, segundo a actual a responsável editorial, “a Anita dos nossos tempos vai ser a Martine da nova geração. O encanto da coleção vai muito para além do nome”. Esperemos que sim…

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