Pois é, estamos a viver um novo confinamento, para além de nunca termos estado livres de limitações. E, por isso, começamos a estar fartos desta pandemia e das consequentes restrições, verdade? E a mostrar inquietação, ansiedade e impaciência. Porém, segundo especialistas, a fadiga pandémica pode estar relacionada com o relaxamento nos cuidados com a Covid-19 ser uma ameaça para a saúde global em 2021.

Mas o que é isso de fadiga pandémica? Trata-se de uma desmotivação extrema face a todos os assuntos relacionados com a Covid-19. Um “fenómeno” que, de acordo com a OMS, requer a atenção de governos e máximas autoridades de saúde. Esta organização internacional traçou, inclusive, um perfil a este “sentimento” de exaustão provocado pelas mudanças ligadas ao Coronavírus, porém, ainda é muito cedo para conseguir apurar, com exactidão, quantas pessoas abrange e a repercussão nos números da pandemia, ou seja, a percentagem de novos casos directamente ligado a este fenómeno. Segundo a doutora Carla Nunes, Directora da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP): “a fadiga pandémica prende-se com a incapacidade de reacção das pessoas a algo relacionado com a pandemia. No fundo, as pessoas já esgotaram toda a sua energia — mental ou física — a reagir ao vírus e estão num estado em que já não conseguem desenvolver nenhuma actividade relacionada com a covid-19”, como ver notícias ou desinfectar as mãos. Já o especialista em Saúde Internacional, Tiago Correia, classifica esta condição como um “ponto de ruptura mental” que, em casos extremos, pode levar a episódios de agressividade e inquietação, dois dos sinais mais evidentes para quem está sob fadiga pandémica. “Só o futuro dirá se não estamos a lidar com um dos maiores factores de degradação da saúde mental a nível mundial.” Por isso, muita atenção, pois a “avalanche” de informação que rodeia a Covid-19 – aliada à desinformação e contra-informação que circula um pouco por todo o lado e nas redes sociais – pode incutir-nos um sentimento de insegurança e medo.

Por isso, devemos ter cuidado, pois a degradação da nossa saúde mental é, inevitavelmente, uma das grandes consequências da pandemia da Covid-19. E tal, somando-se aos já preocupantes índices de depressão e outros problemas do foro da saúde mental registados antes do aparecimento do novo Coronavírus, à obrigatoriedade do distanciamento social, ao crescente desemprego e à abrupta quebra nos rendimentos inerentes à situação de pandemia, coloca ainda mais pressão sobre a população.



Mas atenção: além de afetar profundamente qualquer indivíduo que padeça deste novo tipo de fadiga, tal pode implicar um risco maior para a saúde pública, pois as pessoas afectadas deixam de adoptar as devidas precauções para evitar o vírus, por considerarem que os seus actos não farão qualquer diferença no panorama geral da pandemia. As pessoas desligam-se porque sentem que já tiveram todos os cuidados durante um tempo e, neste momento, já não encontram mais energia para reagir. Além desta displicência quanto aos cuidados e recomendações das autoridades, a fadiga pandémica comporta ainda alterações comportamentais súbitas, como estado de inquietação, ansiedade, impaciência, e, em casos extremos, pode transformar-se em agressividade em relação às autoridades de saúde, jornalistas e até mesmo poderes políticos.

Pensa-se, inclusive, que este “desleixo”, que se prende com a indefinição e extensão temporal da pandemia, tenha sido a principal causa de os números terem aumentado como nunca. Sem a vacina ainda à vista para a maior parte, um novo confinamento, dado as restrições do Estado de Emergência prévio não terem conseguido travar a disseminação do vírus, os afectados por esta fadiga pandémica sentem, ainda mais, que não há qualquer controlo da situação, acabando por deixarem de cumprir as directrizes de distanciamento social, a desinfeção das mãos e o uso de máscara.

De facto, este novo confinamento poderá produzir efeitos especialmente nocivos para quem sofre deste tipo de fadiga. Pois as pessoas questionam-se: quantas mais vezes vamos fazer isto (confinamento)? E por quanto tempo? Um novo confinamento agrava, sem dúvida, a situação destas pessoas e esta fadiga leva, numa fase extrema e segundo especialistas, a distúrbios mentais. Segundo a delegação europeia da OMS, há países em que o sentimento de fadiga pandémica pode afectar já mais de 60% da população.



Mas quer alguns padeçam deste tipo de fadiga ou estejamos mesmo cansados desta pandemia que teima em não dar tréguas, aqui deixo oito dicas para tentar combater tal estado e enfrentar um novo período de isolamento em casa.

1. Sentirmo-nos cansados e desmotivados é normal
Importa esclarecer que numa altura de crise pandémica, os sentimentos de cansaço e desmotivação são perfeitamente comuns. É normal sentirmo-nos ansiosos, preocupados e tristes, mas felizmente, a maioria das pessoas acaba por se adaptar e encontrar a tranquilidade necessária para lidar com a adversidade destes penosos dias. Aquilo que nos cansa e desmotiva são as dificuldades em diminuir ou erradicar a transmissão do vírus e as consequências sociais e financeiras que se abatem sobre quase todos. Atentem que a saúde mental também está em risco — com estimativas que apontam para que 20 a 30% sofram com o impacto psicológico da pandemia, segundo a Ordem dos Psicólogos. Por isso, como eu sempre digo na minha conta de Instagram, é importante não baixar a guarda. Numa altura em que redobramos esforços para combater o vírus, é importante continuar a fazer a nossa vida, procurando actividades que aumentem o nosso bem-estar, mas que sejam de risco reduzido.

2. Manter uma rotina
Sabiam que definir uma rotina é algo fundamental para o funcionamento do nosso organismo e para o nosso bem-estar físico e psicológico? Então, mesmo em confinamento, ajuda continuar a agir como se vivêssemos em condições normais: vestirmo-nos e arranjarmo-nos para trabalhar, alimentarmo-nos de forma adequada e regular, praticar exercício físico e separar os períodos de trabalho dos de descanso/lazer com muita exatidão, pois tal não só ajuda a preservar a normalidade, mas também a preservamo-nos. É igualmente recomendado e salutar ter planos diferentes para o fim-de-semana e tecer planos para o futuro, mesmo a curto prazo, como uma caminhada ou uma videochamada; planear uma viagem para mais tarde, quando for possível viajar em segurança e sem restrições, também é benéfico. Afinal, sonhar sempre fez bem.

3. Não descurar cuidados
Por muito cansados que todos possamos estar, há cuidados básicos que não podem nem devem ser descurados e que se vão enraizando com o hábito, como o uso de máscara, a lavagem ou desinfecção das mãos e a prática do distanciamento social, que nunca deixam de ser importantes — ainda mais agora, que se registam centenas de novos casos diariamente.
Mesmo que custe, não se pode facilitar. É mais fácil se o desinfectante e a máscara estiverem sempre à mão. Infelizmente, é certo que a pandemia ainda está para durar, por isso adaptar a nossa vida ao novo Coronavírus é possível.

4. O bem-estar acima de tudo
Ao estarmos a viver um tempo marcado pela incerteza, pelo medo e, em muitos casos, por dificuldades financeiras, a activação prolongada ou excessiva dos mecanismos biológicos de resposta ao stress é um factor de risco para o desenvolvimento de ansiedade e depressão. Por isso, é preciso cuidar do nosso bem-estar. Neste tempo frio, é importante comer bem e privilegiar uma alimentação saudável e variada — incluindo frutas e leguminosas —, fazer exercício físico e sair para espaços verdes ou apanhar sol para estimular a produção de vitamina D. Pode até ser na saída para as necessárias compras, mas sempre em segurança, com a noção do risco associado. Além disso, é importante procurar actividades que promovam o bem-estar em casa, como ler, escrever, desenhar, pintar, jogar, ver filmes ou séries, cozinhar, tratar das plantas, telefonar a amigos ou familiares…

5. Evitar álcool, drogas e outros comportamentos excessivos
Embora possam parecer uma escapatória fácil à realidade e representarem uma forma de passar o tempo, não se deve abusar de consumos que causem dependência, precisamente por provocarem um efeito oposto ao esperado. É sabido que os confinamentos agravam os riscos relacionados com as dependências: há países em que foi registado um aumento do consumo de álcool durante o confinamento e, em Portugal, alguns dados apontam para um aumento do jogo online.
Por isso, é da maior importância garantir que os consumos de substâncias aditivas e os hábitos de jogo e consumo da Internet se fazem de forma moderada e sem prejuízo do funcionamento global.

6. Desligarmo-nos das redes sociais e das notícias
Ouvir notícias sobre a Covid-19 constantemente, olhar para o email ou computador fora das horas de trabalho ou passar muito tempo a fazer scroll das redes sociais podem produzir um efeito nocivo na saúde mental e contribuir para a fadiga de que aqui falo. É importante aprendermos a desligar, mesmo que seja só durante umas horas ou durante um dia, e saber dosear o tempo dedicado a cada uma destas tarefas. De facto, em tempo de restrições é preciso estarmos informados, mas não é por passar um dia sem lermos ou ouvirmos notícias que ficaremos desactualizados. É preciso reconhecer quando a mente precisa de descansar. Ao logo da pandemia, os órgãos de comunicação social para além de terem sido veículos importantes na disseminação de informação útil, também o foram na exacerbação de alguns medos, contribuindo para o aumento dos níveis de ansiedade. Por isso, é importante seleccionar adequadamente as fontes de informação, evitando os media mais sensacionalistas, as fake news, publicações de desinformação e teorias da conspiração que muitas vezes circulam em sites duvidosos e nas redes sociais, garantindo moderação no consumo que se faz de redes sociais. Evitar consultar o email, atender telefonemas ou agendar reuniões fora do horário de trabalho é igualmente importante.

7. Separar trabalho da vida pessoal
O equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é um desafio difícil, mas essencial. Com um novo confinamento, regressa o teletrabalho em força para muitos portugueses. Uma repetição do aconteceu a partir de Março. Uma das vantagens do regime de teletrabalho é que há aspectos que se tornam mais fáceis: perdemos menos tempo em transportes e deslocações, e conseguimos passar mais tempo connosco próprios ou com os nossos bichinhos de estimação. Por outro lado, pode haver uma maior pressão para demonstrar o seu valor na organização onde trabalha para garantir o seu emprego, já que a segurança e estabilidade laboral são importantes em tempos de crise. 
O desequilíbrio entre estas duas esferas pode levar a um aumento do stress e de outros problemas como a ansiedade, depressão ou consumo problemático de substâncias — podendo afectar também a produtividade, a satisfação com o trabalho e, consequentemente, ter um impacto negativo nas relações parentais ou conjugais.
Por isso, é recomendável que o trabalhador saia do espaço de trabalho durante a pausa para almoço e que defina um alerta para se lembrar de fazer pausas regulares, pois para quem trabalha em casa, é importante criar uma rotina que facilite a transição psicológica do contexto casa-trabalho para casa-família (e vice-versa). Pode ser dar um passeio a pé, como uma ida às compras, ou beber um café à janela antes de iniciar o trabalho.
É ainda relevante ser realista e saber dizer “não” quando as tarefas pedidas são irrazoáveis ou impraticáveis, sem esquecer as coisas básicas, como dormir horas suficientes.

8. Não ter receio de pedir ajuda
Se chegarmos a uma altura de limite, em que nos sentimos exacerbado pelos nossos sentimentos e pela realidade que nos rodeia, podemos sempre falar do que sentimos com familiares, desabafar com amigos, inclusive pedir ajuda profissional. Quem sentir que a ansiedade e a tristeza provocam um sofrimento e uma disfuncionalidade importantes deve procurar apoio junto dos mais próximos, contactar a linha SNS24 de Apoio Psicológico e recorrer à ajuda profissional do médico de família, de um psicólogo ou de um psiquiatra.



E devemos manter o positivismo! Tentar sempre ver o bom lado das coisas. Por exemplo, 2020 não foi de todo um ano mau. Sim, a chegada de uma pandemia ensombrou o virar da década, trocou-nos as voltas, impedindo-nos de estar próximos de quem gostamos e de fazermos a nossa vida “normal”, mas também houve momentos de luz: no mesmo ano em que ouvimos falar pela primeira vez do SARS-CoV-2, desenvolveu-se uma vacina em tempo recorde. Foi um ano de conquistas no desporto português e um ano de intensa produção científica.

Foi o ano em que se desenvolveu a vacina mais rápida da história, um recorde conseguido no mesmo ano em que se ouviu falar pela primeira vez deste novo Coronavírus. Foi também o ano em que ficou a descoberto a boa vontade e a generosidade de quem saiu das suas casas para enfrentar o desconhecido e ajudar os outros — fosse a trabalhar na linha da frente ou em serviços essenciais, fosse para estender as mãos aos vizinhos ou a necessitados, que sofreram na pele os danos colaterais da pandemia.

Despeço-me com esta mensagem: Fiquem em casa, por vocês, por todos nós!

Fonte: Artigos do jornal "Público"

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