O Carnaval existe desde sempre… Desde os egípcios, que homenageavam a Deusa Ísis e o Touro Ápis. Entre os gregos e romanos havia as festas Bacanais, Lupercais e Saturnais, onde os escravos tomavam o lugar dos senhores e os senhores o dos escravos. Já na Idade Média, com o domínio da vida religiosa e do culto aos santos, tais festividades foram perdendo força. Mas mais adiante, o santo Entrudo surgiu como uma manifestação religiosa, onde a igreja se misturava com o povo em danças e procissões. A partir do século XVI, a Igreja Católica estabelece a data da Quaresma e, em consequência, a dos festejos de Carnaval. Estes deveriam limitar-se aos três dias antes do início da Quaresma, que começa na Quarta-feira de Cinzas, ou seja, no dia seguinte ao dia de Carnaval.

A Itália do século XVI transfigurou o Carnaval, transformando-o na obra-prima de poetas e pintores. Em pleno século XVIII, Veneza cria o Pierrot, a Columbina, o Arlequim e o Polichinelo, numa celebração que une teatro, dança e espectáculos acrobáticos. No Carnaval de Veneza, a partir do século XVII, a nobreza disfarçava-se para poder desfilar e misturar-se com o povo e a partir de então, as famosas máscaras de Veneza tornaram-se um símbolo e a peça mais emblemática deste Carnaval até aos dias de hoje.

Em França, o Carnaval era uma manifestação mais artística, onde prevalecia a ordem e a elegância, com os seus bailes e desfiles alegóricos. Já no Brasil, o Carnaval festeja-se desde os finais do século XVIII e a partir de então, ganhou uma projeção sem igual. Actualmente, é a maior festa do país, com as suas escolas de samba, danças, fantasias e monumentais carros alegóricos.

Ora, o Carnaval do Brasil foi, como é natural, introduzido pelos portugueses e foi acompanhando a evolução dos costumes cá da metrópole. Em Portugal, em princípios do século XIX, co-existiam duas tradições carnavalescas: a rural e a urbana. Na rural, os festejos carnavalescos, denominados Entrudo, concentravam-se nos três dias que antecediam a Quarta-Feira de Cinzas. Apesar da sua enorme diversidade, em todo o país, tinham alguns pontos em comum: a entronização do Rei do Carnaval, a realização de grandes comezainas, brincadeiras de todo o tipo, onde se atiravam água, farinha ou lama à cabeça das pessoas. Grupos de mascarados, em cortejos pelas ruas, cantavam e dançavam, fazendo um enorme barulho e aterrorizando tudo e todos. A festa só terminava com o enterro do Entrudo (Quarta-Feira), símbolo da folia, associadas a forças pagãs ou diabólicas. Na tradição urbana (sobretudo Lisboa e Porto), o Carnaval começou a "civilizar-se". Os cortejos desregrados de foliões foram sendo substituídos por cortejos de carruagens profusamente ornamentadas, que passeavam pelas principais ruas e avenidas, atirando confeites, flores, etc. E as festas grosseiras foram sendo substituídas por bailes de mascarados.

Na cidade de Lisboa, os cortejos eram acompanhados por figuras populares como o “Xé-Xé”, uma das principais personagens do Carnaval até cerca de 1910. Chamavam-lhe Salsa, Peralta ou Pisa-flores. Era uma caricatura da Lisboa do século XVIII. Usava uma casaca colorida com punhos de renda, sapatos de fivela, cabeleira de estopa, um enorme bicorne, luneta de vidro e bastão ornado de um chavelho. Quanto aos bailes de máscaras, assaltos e corsos, eram espectáculos reservados à burguesia, que se adornava para passear na Avenida da Liberdade e subir o Chiado, em caleche ou carro alegórico, decorados de forma vistosa e imaginativa. Os dois tipos de Carnavais mantiveram-se em Portugal até ao presente, embora adaptando-se aos tempos modernos.

Assim, no Brasil, predominou até meados do século XIX, o Entrudo rural português. O Carnaval urbano português foi introduzido em 1853, quando um grupo de jovens ligados ao comércio do Rio de Janeiro, onde predominavam os portugueses, resolveu mascarar-se e percorrer, em carruagens, algumas ruas da cidade. A população local reagiu bem a este tipo de festejos, e estes não tardaram a criar o Congresso das Sumidades Carnavalescas para preparem e organizar estes festejos. Pouco depois, forma-se formando outras colectividades. Em 1899, o rancho Rosa de Ouro encomendou a Chiquinha Gonzaga uma música para o desfile carnavalesco ("Ó Abre-alas"), surgindo, assim, a primeira música especialmente concebidas para o Carnaval. Com a profusão dos automóveis, os cortejos de carros alegóricos passaram a ser motorizados. Em Portugal, o fenómeno foi idêntico, onde se tornaram muito populares as "batalhas de flores".

Em 1929, foi criada a primeira escola de samba do Brasil, a “Deixa Falar”. Por seu turno, a portuguesa Carmem Miranda (natural de Marco de Canavezes) lá radicada, nos anos trinta e quarenta do século XX, veio popularizar a fantasia no vestuário dos foliões carnavalescos. Mais tarde, a folia começou a perder a sua dimensão espontânea e irreverente, passando a assumir, como em algumas terras de Portugal, uma estrutura organizada e pensada para atrair e divertir os locais e turistas. O espírito ruidoso e irreverente começava a desaparecer no Brasil. E o Carnaval passou a ser um cortejo ordeiro, num espaço fechado, apenas para turista ver.

Engraçado, volvido todo este tempo e sabendo que também neste campo demos “novos mundos ao Mundo”, ver que agora se sucede o contrário. A tradição a deixar de ser o que era por cá e vermos a folia brasileira a ser adaptada, sem eira, nem beira. Não temos o clima quente, nem o “samba” faz parte de nós, para depois vermos "garotas" lusas, bem descascadas, a sambarem pelos cortejos de rua… Não combina! Mas, enfim... Bom Carnaval!!!

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