Nas últimas duas semanas assisti a duas antestreias de filmes que me surpreenderam… já para não falar de “Doutor Sono” e do novo “Família Addams” em versão animação. Comecemos pelo primeiro que foi o ultimo a entrar em cartaz…



“Os Órfãos de Brooklyn”

Esta é uma história pela qual Edward Norton nutria grande afeição, ao ponto de a querer levar ao grande ecrã. O romance Órfãos de Brooklyn, de Jonathan Lethem, chegou às livrarias antes do virar do milénio, em 1999. E assim que os olhos de Edward Norton se confrontaram com as suas 360 páginas, urgiu nele a vontade de adaptá-lo à tela. Por isso, Norton realiza e protagoniza o filme que conta ainda com Willem Dafoe, Bruce Wills, Cherry Jones, Bobby Cannavale, Gugu Mbatha-Raw, Leslie Mann. Michael K. Williams e Alec Baldwin.

Tendo Nova Iorque como pano de fundo, em 1950, o filme centra-se em Lionel Essrog (Edward Norton), um solitário detective privado que sofre de síndrome de Tourette, o que faz com que volta e meia não tenha controlo sobre o que diz. Ainda assim, ele vai tentar resolver o mistério por detrás do assassinato do seu mentor e único amigo, Frank Minna (Bruce Willis). Munido apenas de algumas pistas e com o “rastilho” da sua mente obsessiva, Lionel desvenda segredos bem guardados que mantêm o destino da Big Apple na corda bamba. Envolto num mistério que o leva dos clubes de jazz molhados de gin no Harlem aos bairros pobres de Brooklyn e, finalmente, aos corredores dourados dos corretores de Nova Iorque, Lionel vai ter de enfrentar bandidos, corrupção e o homem mais perigoso da cidade, para honrar o seu amigo e salvar a mulher que poderia ser a sua própria salvação.

Baseado no livro homónimo já referido, o grande atractivo do filme é o inusitado da sua personagem principal, que sofrendo do tal síndrome de Tourette, faz com que compulsivamente toque nas pessoas ou, sem qualquer motivo, fale aleatoriamente algum palavrão, o que torna Lionel Essrog num insólito e invulgar detective. Inspirado nos film noir de detectives dos anos 1950, “Os Órfãos de Brooklyn” entrega um bom trabalho de época, em particular no figurino, aliado a uma banda sonora que incorre no jazz para dar ritmo à narrativa.

Dezanove anos depois de “Sedutora Tentação”, uma comédia romântica, Edward Norton regressa à realização com este “Os Órfãos de Brooklyn”. Norton, que também escreve o argumento, parece ter analisado “Chinatown” (1974) ao pormenor, pois tal como neste clássico de Polanski, encontramos aqui o mesmo tipo de conspirações, segredos familiares e detetives privados que procuram uma verdade escondida pelos que estão no Poder. "Os Órfãos de Brooklyn" conta uma história de poder e corrupção onde os mais poderosos estão à frente da lei.



Regressando à narrativa, Lionel, devido ao seu problema, apresenta uma memória afinada. Ele possui uma mente que funciona como um autêntico gravador: se lhe é dito qualquer coisa, ele decora e desbobina praticamente sílaba a sílaba o discurso anterior. O mesmo acontece com uma ação. Uma espécie de memória fotográfica. E ao investigar o assassinato do seu mentor/patrão/figura paterna, Frank Minna (Bruce Willis), para vingar a morte da única pessoa que o aceitou tal como era, acaba por cair na teia montada por Mo (Alec Baldwin) — supostamente um mero comissário de parques urbanísticos —, que está a controlar a cidade e todos os trabalhos da área da construção. Obsessivo, Lionel passa a percorrer vários trechos da cidade em busca de respostas, até encontrar um caminho através da especulação imobiliária em vizinhanças resididas em sua maioria por pobres e negros.

Nesta jornada, impulsionada pela narração em off que traz as suas próprias memórias e divagações acerca do caso, surgem algumas questões interessantes, como a ponderação sobre a falta de informação dos repórteres de TV em detrimento da imprensa escrita - com direito a uma fina ironia, reflectida nos dias actuais - e algumas nuances que aproximam a personagem de Alec Baldwin ao perfil de Donald Trump. Porém, são uns longos 144 minutos de filme e às vezes, o ritmo perde-se. “Os Órfãos de Brooklyn” ainda comete a falha de entregar um desfecho apressado, no sentido das respostas tão procuradas surgirem muito repentinamente. No entanto, é um filme que explora complexos problemas sociais e que coloca inúmeras questões. Ou seja, embora seja um drama passado nos anos 50, não deixa de ser contemporâneo. Norton utilizar o contexto de Nova Iorque desse tempo para falar de uma realidade que não podia ser mais actual: a gentrificação e a forma como o dinheiro transforma uma cidade.




"Midway"

Este é um outro tipo de filme, nos cinemas desde 7 de Novembro. “Midway” centra-se precisamente e conforme o seu nome indica, nessa batalha histórica da Segunda Guerra Mundial, entre americanos e japoneses, que ficou conhecida assim.

Em Dezembro de 1941, a Marinha Imperial Japonesa atacou de surpresa e de forma inesperada a base militar Pearl Harbor, dos Estados Unidos, situada numa ilha do Hawai. Com tamanho e atroz acontecimento, os EUA, até então neutros, anunciaram a sua participação na Segunda Guerra Mundial. Tal agressão marcou o início da guerra no Oceano Pacífico. Seis meses depois, em junho de 1942, aconteceu a Batalha de Midway, conflito entre aviões e embarcações do Japão e dos EUA que durou três dias. Agora, a história dessa disputa surge contada na visão dos norte-americanos no filme “Midway”. O confronto marítimo entre a marinha americana e uma numerosa frota japonesa, que pretendia realizar um novo ataque-surpresa aos EUA, é retratado no filme. Porém, a invasão japonesa foi antecipada pela interceptação e decifração de códigos secretos, permitindo às forças americanas saberem exactamente quando e por onde os navios inimigos iriam chegar. O resultado foi a destruição da frota invasora e um grande golpe na capacidade japonesa de tentar levar a guerra aos EUA.

A longa-metragem tem realização a cargo de Roland Emmerich, o mesmo dos filmes de catástrofe “Independence Day” (1996) e “O Dia Depois de Amanhã”(2004), argumento escrito por Wes Tooke (“Colony”) e é protagonizada por um elenco de peso, com Patrick Wilson, Woody Harrelson, Ed Skrein, Darren Criss, Luke Evans, Aaron Eckhart, Mandy Moore, Nick Jonas (do grupo pop Jonas Brothers) e Dennis Quaid, apesar de também participarem vários actores japoneses.

Repleto de acção, o filme faz uso da tecnologia de CGI para criar os efeitos especiais do conflito, bem como os navios e os aviões. De tal forma que mesmo não sendo em 3D, parece que estamos mesmo no centro dos eventos. De facto, é esse o seu grande trunfo, a experiência de ver a guerra no grande ecrã com uma óptima definição, com a capacidade de nos transportar para aquele universo, graças aos efeitos especiais visuais, um dos elementos também alvo dos maiores leigos em “Midway”. Ao todo, são quase duas horas e 20 minutos de acção, que tentam mostrar uma perspectiva bastante fiel em relação ao que aconteceu na realidade. Há também elementos reais a comporem o cenário e o figurino: itens que foram usados por soldados norte-americanos, como broches, estão presentes na produção.



"Midway foi uma das principais batalhas da Segunda Guerra Mundial", diz Quaid, que interpreta William "Bull" Halsey Jr., um almirante-de-esquadra da Marinha dos EUA. O actor ainda contou que o seu pai lutou na guerra. "É a maior reviravolta militar da história", afirma Nick Jonas, intérprete do aviador Bruno Gaido, que foi capturado pelos japoneses.

“Midway” tem sido apresentado como um filme respeitoso relativamente à história, que leva os acontecimentos a sério e que quer homenagear os corajosos soldados que lutaram pela sobrevivência de uma civilização, embora o ponto de vista assumido seja o americano. Na sua estreia, o filme de Emmerich surpreendeu o mercado, ao abrir em 1º lugar nos Estados Unidos e Canadá com uma bilheteira de 17,5 milhões de dólares.

Vale lembrar que o primeiro filme desta história, “A Batalha de Midway”, em 1976, protagonizada por Charlton Heston, Henry Fonda, James Coburn, Robert Mitchum, Glenn Ford, Robert Wagner, Cliff Robertson e Toshirô Mifune, também deveu grande parte do seu êxito aos efeitos especiais. Na ocasião, foi o segundo filme a usar a tecnologia sonora Senssuround, criada para intensificar os tremores do filme de desastre “Terremoto” (1974).



Concluindo, “Midway” é uma homenagem respeitosa aos heróis que lutaram na batalha com o mesmo nome, porém não consegue entregar uma história envolvente, com personagens emocionalmente convincentes. Mas acho que nem seria o suposto, ao Roland Emmerich querer mostrar a verdade numa história que teve, infelizmente, muitos intervenientes e demasiadas mortes. E Emmerich está de parabéns, por ter apresentado uma acção de guerra o mais realista possível da famosa batalha. Visuais verdadeiramente épicos com sequências aéreas tensas e fascinantes, além de uma produção sonora poderosa, que nos obrigam a agarrar à cadeira. Recomendo, sobretudo para quem gosta de épicos de guerra e adaptações “baseadas em histórias verídicas”.

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