A casa de artigos de couro Delvaux esteve à beira da falência em 2011, mas o ex-executivo da Louis Vuitton, Jean-Marc Loubier, salvou-a e transformou-a numa marca incontornável. Loubier afirma que o seu objetivo sempre foi transformá-la numa marca de mil milhões de dólares e que resistiu à pandemia concentrando-se nos clientes locais dos principais mercados

Mas o que é a Delvaux? Sendo um segredo bem guardado da Bélgica durante quase dois séculos, atualmente trata-se de uma marca de carteiras que ganha destaque no closet de mulheres que procuram uma elegância sem logótipo. Fundada em 1829, a Delvaux é fornecedora oficial da Corte Real da Bélgica desde 1883. Conhecida pelas suas carteiras luxuosas, como a Brillant e a Tempête, a marca situa-se no topo da pirâmide do luxo. Enquanto as shopping bags listradas da Balenciaga e as versões estampadas da Dionysus da Gucci ganhavam peso nas passarelas e no street style nas últimas semanas de moda, esta marca belga conquistou mulheres elegantes que não querem saber da it bag da estação, procurando antes um acessório que não "grite" luxo no logótipo.

A Delvaux nasceu como um atelier de malas e permaneceu durante quase dois séculos como uma marca essencialmente local. Visionário, Charles Delvaux fundou a empresa batizada com o seu apelido em 1829 - oito anos antes de a Hermès ser criada e 25 antes da Louis Vuitton -, já prevendo o desenvolvimento do sistema ferroviário. Seis anos depois, a primeira linha de caminhos de ferro para passageiros seria inaugurada no país ligando Bruxelas a Mechelen - em 1875, a Bélgica já contava com a maior rede de carris do mundo. Percebendo a necessidade de as mulheres levarem uma mala consigo no vagão (além dos pesados baús), Monsieur Delvaux começou a desenvolver também alguns protótipos de carteiras.

De facto, Charles Delvaux começou a fabricar baús em madeira e em couro, para uma Europa que estava a começar a viajar, e a descobrir esta indústria por meio de carruagens, de comboios ou de barcos. As pessoas precisavam de baús grandes para viajar e foi assim que tudo começou… Enquanto isso, Louis Vuitton preparava-se para abrir, alguns anos depois, o seu atelier em Asnière, perto de Paris.

O grande salto aconteceria em 1933, quando a marca foi adquirida pelo belga Franz Schwennicke, que apostou no conceito de coleções sazonais da moda - assim, transformou a Delvaux numa marca de carteiras de luxo. Com Franz Schwennicke a assumir a direção da empresa, a Delvaux torna-se uma marca exclusiva e é a primeira a introduzir coleções sazonais, espelhando as práticas da Alta Costura. Sob a sua direção e, mais tarde, a da sua mulher, Solange, a Delvaux produz inúmeras obras-primas. Os ateliers de Bruxelas e de França produzem malas de mão que se destacam na história da marroquinaria, como a "Brillant", criada para a Feira Mundial de Bruxelas, em 1958.

Mergulhada no espírito do surrealismo belga, a maison Delvaux traz uma abordagem espirituosa a todas as suas criações, infundindo em cada design um toque não convencional e original. A primeira casa de marroquinaria de luxo do mundo é diferente de todas as outras. Nas mãos dos seus artesãos de pele altamente qualificados, as carteiras Delvaux tornam-se verdadeiras obras de arte.

A maison belga tem uma longa e rica história, que se confunde com a da Bélgica. Em 1859, Paola, a rainha, recebe para o seu casamento uma carteira feita em sua homenagem chamada “Mon Grand Bonheur”(a minha grande felicidade) e vira "febre" total no país. Desde 1829, foram criados mais de 3.000 modelos de malas de mão. Até hoje, cada nova criação continua a ser descrita, esboçada e catalogada no Livro de Ouro da Delvaux, o "Livre d'Or". Charles Delvaux foi o inventor da carteira moderna, tendo registado a primeira patente de carteira feminina em 1908.

Adquirida pela First Heritage Brands, uma empresa de investimento chinesa controlada pela família Fung, em 2011, a marca tem-se expandido muito a nível mundial, abrindo lojas próprias em Nova Iorque, Paris, Londres, Roma, Milão e Hong Kong. Após a aquisição, multiplicou as suas vendas por um factor de 10 e opera agora 45 lojas monomarca em todo o mundo. Nesse mesmo ano, Christina Zeller juntou-se à Delvaux como Diretora de Imagem e Produto, tendo desempenhado um papel decisivo na redefinição das diferentes coleções. Em 2017, à medida que o crescimento levantava vôo com aumentos anuais significativos de duas vezes por ano, a Delvaux nomeou Zeller sua Diretora Artística. Em janeiro de 2020, para além dessa função, Zeller foi também nomeada responsável pela Comunicação. Durante o seu mandato, Zeller foi fundamental para transformar a Delvaux numa verdadeira marca de luxo, misturando as suas qualidades artesanais únicas com elementos do surrealismo, fazendo referência aos grandes artistas belgas como René Magritte.

Em meados de 2020, Zeller, deixa a empresa após quase uma década na marca de luxo belga. A sua saída ocorre dez meses depois de o seu Diretor Executivo Jean Marc Loubier ter sido sucedido por Marco Probst. Loubier deixa a Delvaux, mas continua como presidente da First Heritage Brands, a holding que controla a Delvaux, na qual detém uma participação minoritária. Depois de ter sido Diretor-Geral da marca de marroquinaria de 2012 a 2018, Marco Probst é novamente o Diretor-Geral da maison. Ele guarda o seu segredo de gestão, com um rigor germânico misturado com um pouco de fantasia belga.

Jean-Marc Loubier

Jean-Marc Loubier é um executivo muito experiente no sector do luxo. Foi anteriormente Vice-Presidente executivo da Louis Vuitton, responsável pelo desenvolvimento de produtos, comunicação e distribuição, e também Diretor-Geral da Céline e, mais tarde, da Escada. Há dez anos, juntou-se a dois pesos pesados da distribuição de Hong Kong, os irmãos Victor e William Fung, para gerir o seu fundo de investimento europeu orientado para o luxo, Fung Brands, que mais tarde se tornou First Heritage Brands, no qual o fundo soberano de Singapura Temasek também tem uma participação. "Comprei a Delvaux em 2011, quando a maison estava em grandes dificuldades. Atualmente, a empresa tornou-se rentável e gera uma receita muito superior a 100 milhões de euros. Tomei conta da Delvaux durante algum tempo, quando Marco Probst saiu, para acelerar a sua diversificação em termos de produtos e mercados, e para a transformar numa marca global. Decidi agora voltar a dedicar-me a tempo inteiro ao papel de presidente e acionista da First Heritage Brands", declarou Loubier. Quando o empresário de luxo francês Jean-Marc Loubier comprou a casa de marroquinaria Delvaux em 2011, a marca belga estava a morrer. A sua oficina estava prestes a encerrar e as carteiras da empresa, outrora veneradas, eram vistas como malas que as avós poderiam usar. Muitas vezes referida como a "Hermès da Bélgica", a marca de malas de luxo Delvaux conseguiu com Loubier um regresso incrível, com a China a ser a chave. "Sem os meus parceiros chineses, a Delvaux não existiria hoje. Eles assumiram o risco", defende Loubier, que desde que assumiu o controlo da empresa aumentou dez vezes a sua dimensão.

 Marco Probst

Por seu turno, o novo Diretor-Geral da Delvaux, Marco Probst, é um nome bem conhecido no mundo das marcas de luxo. Antes de passar pela Chloé, propriedade da Richemont, esteve na Hugo Boss durante sete anos e ocupou vários cargos de chefia nos Países Baixos, Japão e Hong Kong. Em junho de 2021, o grupo suíço de luxo Richemont, por detrás de casas premium como a Cartier e a Van Cleef & Arpels, adquiriu a Delvaux por um montante não revelado à First Heritage Brands. Loubier, que já tinha saído, mas permanecia como acionista, foi o homem por detrás do negócio.

A centelha inovadora de Charles Delvaux transformou esta maison sediada em Bruxelas numa pioneira em artigos de couro de luxo, impulsionando-a para a vanguarda com um compromisso infalível com a qualidade. As malas Delvaux não existem apenas, elas nascem - de um esboço no seu venerado "Livre d'Or", descritas, catalogadas e amadurecidas pelas mãos hábeis dos seus artesãos e, finalmente, aventurando-se no mundo como uma peça de arte não convencional, mas original.

Atualmente, as carteiras Delvaux são preferidas por muitas celebridades, incluindo a Rainha Mathilde da Bélgica, Amal Clooney, Olivia Palermo ou Adele. E faltam apenas cinco anos para a Delvaux completar dois séculos de história. Como enfatiza o grupo Richemont, ela é considerada a mais antiga do mundo no segmento de artigos de couro de luxo, anterior até mesmo à Hermès (1837) e à Louis Vuitton (1854). A empresa também é pioneira em outros aspectos. Foi, conforme já referido, a primeira marca a patentear malas de mão de couro, em 1908.

 

“Expressões poéticas de emoção e habilidade, os designs de Delvaux são feitos à mão por artesãos que transmitiram as suas habilidades de geração em geração. Linhas esculturais e couros sensuais há muito definem as criações da maison, imediatamente reconhecíveis pela sua qualidade, sofisticação e atenção aos detalhes”, descreve a Richemont em comunicado.

Ao que tudo indica, parece que a “avó” das it bags vai continuar de vento em popa, a singrar pelos mares das carteiras de luxo. A sua última coleção é um deslumbre! A Delvaux e o artista plástico Kasper Bosmans uniram forças para criar a coleção primavera/verão 2024 da casa belga de marroquinaria, actualizando as suas carteiras clássicas. Uma troca de ideias e de estética entre a maison e o artista, inspirada no mutualismo - a interação benéfica entre diferentes espécies. Tal como as abelhas e as flores, ou as algas e os corais, Delvaux e Bosmans alimentam-se mutuamente, encontrando simetria na sua ousada busca da beleza.

E embora seja sempre uma boa ideia investir em clássicos como a Birkin da Hermès, a Flap da Chanel ou Lady Dior, há que admitir que pode se tornar um pouco monótono ver as mesmas malas e logótipos aos ombros de toda a gente. Por vezes, a melhor forma de se destacar é usar peças que não são imediatamente reconhecíveis, mas que são difíceis de passar despercebidas, graças ao seu fabrico de alta qualidade. Chama-se a isso de luxo discreto (quiet luxury) e, nesse campo, a Delvaux dá cartas.

À medida que a maison continua a misturar a sua rica herança com sensibilidades modernas, a marca permanece na vanguarda da indústria da moda de luxo. E as carteiras Delvaux não são apenas acessórios; são símbolos de um legado que, conforme já vimos, se estende por quase dois séculos. A combinação de artesanato belga, materiais de alta qualidade e design intemporal fez da Delvaux uma das favoritas entre mulheres exigentes e celebridades. Quer seja transportada no braço de um membro da realeza ou de uma estrela de Hollywood, uma carteira Delvaux é mais do que uma afirmação de moda; é um testemunho do fascínio duradouro do luxo e da elegância.


 

 

 



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